2023-01-26 05:00:17
DESTAQUE
Não é possível aplicar por analogia as disposições acerca da pensão alimentícia, baseada na filiação e regida pelo Direito de Família, aos animais de estimação adquiridos durante união estável.
INFORMAÇÕES DO INTEIRO TEOR
Cinge-se a controvérsia a determinar a possibilidade de se aplicar, por analogia, as disposições acerca da pensão alimentícia, baseada na filiação e regida pelo Direito de Família, aos animais de estimação adquiridos durante união estável.
A discussão travada nestes autos, ao contrário daquela discutida no
leading case, julgado pela Quarta Turma do Superior Tribunal de Justiça (REsp 1.173.167/SP), diz respeito não a direitos, mas, sim, aos deveres de arcar com os custos de subsistência dos animais de estimação, adquiridos durante a união estável, após a dissolução desta.
A solução de questões que envolvem a ruptura da entidade familiar e o seu animal de estimação não pode desconsiderar o ordenamento jurídico posto - o qual, sem prejuízo de vindouro e oportuno aperfeiçoamento legislativo, não apresenta lacuna e dá respostas aceitáveis a tais demandas -, devendo, todavia, o julgador, ao aplicá-lo, tomar como indispensável balizamento o aspecto afetivo que envolve a relação das pessoas com o seu animal de estimação, além da proteção à incolumidade física e à segurança do
pet, concebido como ser dotado de sensibilidade e protegido de qualquer forma de crueldade.
A relação entre o dono e o seu animal de estimação encontra-se inserida no direito de propriedade e no direito das coisas, com o correspondente reflexo nas normas que definem o regime de bens da união estável. A aplicação de tais regramentos, contudo, submete-se a um filtro de compatibilidade de seus termos com a natureza particular dos animais de estimação, seres que são dotados de sensibilidade, com ênfase na proteção do afeto humano para com os animais.
A aplicação de tais regramentos tem o condão justamente de preservar a relação afetiva e os cuidados estabelecidos entre a demandante e os seus animais de estimação, sem que se possa admitir a interferência, de qualquer índole ou extensão, de quem não mais é, há muito, dono dos
pets e não nutre nenhuma relação afetiva com eles.
Se, em virtude do fim da união, as partes, ainda que verbalmente ou até implicitamente, convencionarem, de comum acordo, que o animal de estimação ficará com um deles, este passará a ser seu único dono, que terá o bônus de desfrutar de sua companhia, arcando, por outro lado, sozinho, com as correlatas despesas.
Não se poderia conceber em tal hipótese - em que, extinta a união estável, com inequívoca definição a respeito de quem, doravante, passaria a ser o dono do animal de estimação -, pudesse o outro ex-companheiro, por exemplo, passado algum tempo e sem guardar nenhum vínculo de afetividade com o animal, reivindicar algum direito inerente à propriedade deste.
O fato de o animal de estimação ter sido adquirido na constância da união estável não pode representar a consolidação de um vínculo obrigacional indissolúvel entre os companheiros (com infindáveis litígios) ou entre um deles e o
pet, sendo conferido às partes promover a acomodação da titularidade dos animais de estimação, da forma como melhor lhes for conveniente. A partir do fim da união estável, os bens hauridos durante a convivência são regidos pelo correlato regime de bens que, na ausência de contrato escrito entre os companheiros, como é o caso dos autos, segue o da comunhão parcial de bens (art. 1.725 do CC).
Eventual impasse entre os companheiros sobre quem deve ficar com o animal de estimação, adquirido durante a união estável, por evidente, não poderia ser resolvido, simplesmente, por meio da determinação da venda dos
pets e posterior partilha, entre eles, da quantia levantada, como se dá usualmente com outros bens móveis, já que, como assentado, não se pode ignorar o afeto humano para com os animais de estimação, tampouco a sua natureza de ser dotado de sensibilidade.
2.2K viewsRODRIGO TOSCANO DE BRITO, 02:00