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O verdadeiro, o bom e o belo Existe uma ideia encantadora | Teologia, Patrística e História Eclesiástica ⛪️

O verdadeiro, o bom e o belo

Existe uma ideia encantadora sobre a beleza que remete a Platão e Plotino e que foi incorporada ao pensamento teológico cristão. Segundo ela, a beleza é um valor supremo que buscamos por si só, sem ser necessário fornecermos qualquer motivo ulterior. Desse modo, a beleza deve ser comparada à verdade e à bondade, integrando um trio de valores supremos que justifica nossas inclinações racionais. Por que acreditar em p? Porque p é verdadeiro. Por que desejar x? Porque x é bom. Por que contemplar y? Porque y é belo. De certo modo, declararam esses filósofos, tais respostas estão no mesmo plano: cada qual traz um estado de espírito ao âmbito da razão, vinculando-o a algo que nós, sendo seres racionais, buscamos naturalmente. Aquele que pergunta “por que acreditar no que é verdadeiro” ou “por que desejar o que é bom” foi incapaz de compreender a natureza do raciocínio. Ele não percebe que, para justificarmos nossas crenças e desejos, nossa razão deve estar ancorada no verdadeiro e no bom. O mesmo, então, se aplicaria à beleza? Se alguém me pergunta por que me interesso por x, “porque x é belo” seria uma resposta definitiva, isto é, uma resposta imune a qualquer contra-argumento - a exemplo de um “porque é bom” e um “porque é verdadeiro”? Afirmar que sim é negligenciar a natureza subversiva da beleza. Alguém que se veja encantado por determinado mito pode se sentir tentado a crer nele; nesse caso, a beleza é inimiga da verdade (cf. Píndaro, Primeira Ode Olímpica: “A beleza, que dá ao mito aceitação, faz do incrível crível”). Um homem atraído por uma mulher pode sentir-se tentado a perdoar seus vícios, e nesse caso a beleza é inimiga da bondade (cf. Abade Prévost, Manon Lescaut, em que a ruína moral do Cavaleiro des Grieux é causada pela bela Manon). A bondade e a verdade, supomos, jamais rivalizam, e a busca de uma é sempre compatível com o respeito que se deve à outra. A busca da beleza, por outro lado, é muito mais questionável. De Kierkegaard a Wilde, o estilo de vida “estético”, no qual a beleza é almejada como valor supremo, tem sido contraposto à vida virtuosa. O amor aos mitos, às histórias e aos rituais, a necessidade de consolo e harmonia, uma profunda ânsia pela ordem - tudo isso atrai pessoas a crenças religiosas, independentemente de essas serem verdadeiras ou não. Tanto a prosa de Flaubert como a imagística de Baudelaire, as harmonias de Wagner e as formas sensuais de Canova foram acusadas de imoralidade por aqueles que acreditavam que tais artistas retratavam a perversidade de modo sedutor.

– Roger Scruton, Beleza - Cap. I § 4, O verdadeiro, o bom e o belo.